Para poder entender o que foram os movimentos de vanguardas
artísticas ocorridos na Europa no início do século XX é necessário compreender
o contexto histórico ao qual estamos nos referindo. Naquela época, a Europa –
então com 400 milhões de habitantes – se tornou o centro econômico, filosófico
e artístico-cultural do mundo.
No entanto, politicamente, havia uma intensa turbulência
naquele continente. Com a industrialização, a economia agrícola entrou em
colapso, em alguns países, provocando uma série de complicações na estrutura
social. O aumento da concorrência entre os países, devido à industrialização,
provocou um momento de muita tensão. Com o assassinato de arquiduque Francisco
Ferdinando (1), herdeiro do Império Austro-Húngaro, que aconteceu no dia 28 de
junho de 1914, em Sarajevo, houve a culminância da Primeira Guerra Mundial, que
durou de 1914 a 1918. Também nesse período, as levas de imigrantes europeus
chegaram às Américas, possibilitando trocas de culturas. A mão de obra
imigrante reproduzia substituía a escravidão, que mudou de roupagem
chegou ao fim.
Nesse clima social, as ciências apresentaram um enorme
progresso. A eletricidade, o telégrafo sem fio, o rádio, o cinema, o automóvel,
o avião. Tudo isso começou a fazer parte da vida das pessoas nesse contexto,
provocando profundas transformações no jeito de viver. Diante disso, a arte
também passa por transformações. Não se concebe mais o conceito aristotélico de
arte como mimesis (imitação) da
realidade, tampouco a angústia subjetiva do romantismo expressa esse novo
momento. O momento é caótico. A arte também.
Vale lembrar que poetas como Edgar Allan Poe, Charles
Baudelaire, Walt Whitman e Stéphane Mallarmé, entre outros, já produziam obras
de conteúdos e formas revolucionários.
A inquietação intelectual ganhou corpo por meio dos
movimentos artísticos denominados vanguardas, palavra que indica a parcela dos
intelectuais que exerce um papel pioneiro, desenvolvendo técnicas, ideias e
conceitos novos.
Cubismo
Essa palavra – Cubismo – aparece na pintura no ano de 1908,
quando Matisse critica um quadro de Braque, no Salon des Indépendants. Por meio
desse movimento, a pintura recria elementos da realidade por intermédio de
formas geométricas. Em outras palavras, a pintura perde o descritivismo para
apresentar relações e não formas acabadas.
Na pintura (e há quem diga que o que esses artistas faziam
eram ‘pinturas’, mesmo hehehe), destacam-se Pablo Picasso, Juan Gris, Goerges
Braque e Fernand Léger, entre outros.
Futurismo
A Europa foi surpreendida pelo Futurismo em 1909. Esse é o
mais personalista dos movimentos, idealizado pelo Filippo Tomaso Marinetti
(1876-1944), o qual era um egípcio de ascendência italiana e educação francesa.
Sua proposta, fundamentalmente, é rejeitar o passado, o academicismo e destruir
as tradições. Ele preconizava o verso livre, as “palavras em liberdade”, a
“destruição da sintaxe”, a “imaginação sem fios”, enquanto enaltecia a
velocidade e a tecnologia. No total, Marinetti publicou 30 manifestos sobre o
Futurismo, mas em todos propunha o mesmo fascínio pela guerra aos museus e
bibliotecas, repudiando o passado. A partir de 1919, passou a aderir aos ideais
fascistas.
De acordo com o próprio Benito Mussolini, “o fascismo é uma
concepção histórica em que o home é o que é na medida em que trabalha com o
processo espiritual em que se encontra, na família ou grupo social, na nação e
na história em que todas as nações colaboram”. “Contra o individualismo, a
concepção fascista é pelo Estado; e é pelo indivíduo na medida em que este
coincide com o Estado, que é a consciência e a vontade universal do homem na
sua existência histórica”.
MANIFESTO FUTURISTA
(Publicado em 20 de Fevereiro de 1909, no “Le Figaro”)
1. Nós queremos cantar o amor ao perigo, o hábito da
energia e da temeridade.
2. A coragem, a audácia, a rebelião serão elementos
essenciais de nossa poesia.
3. A literatura exaltou até hoje a imobilidade pensativa, o
êxtase, o sono. Nós queremos exaltar o movimento agressivo, a insónia febril, o
passo de corrida, o salto mortal, o bofetão e o soco.
4. Nós afirmamos que a magnificência do mundo se enriqueceu
de uma beleza nova: a beleza da velocidade. Um automóvel de corrida com o seu
cofre enfeitado com tubos grossos, semelhantes a serpentes de hálito explosivo…
um automóvel rugidor, que parece correr sobre a metralha, é mais bonito que a
Vitória de Samotrácia.
5. Nós queremos glorificar o homem que segura o volante,
cuja haste ideal atravessa a Terra, lançada também numa corrida sobre o
circuito da sua órbita.
6. É preciso que o poeta prodigalize com ardor, esforço e
liberdade, para aumentar o entusiástico fervor dos elementos primordiais.
7. Não há mais beleza, a não ser na luta. Nenhuma obra que
não tenha um carácter agressivo pode ser uma obra-prima. A poesia deve ser
concebida como um violento assalto contra as forças desconhecidas, para
obrigá-las a prostrar-se diante do homem.
8. Nós estamos no promontório extremo dos séculos!… Por que
haveríamos de olhar para trás, se queremos arrombar as misteriosas portas do
Impossível? O Tempo e o Espaço morreram ontem. Já estamos vivendo no absoluto,
pois já criamos a eterna velocidade omnipotente.
9. Queremos glorificar a guerra – única higiene do mundo –,
o militarismo, o patriotismo, o gesto destruidor dos libertários, as belas
ideias pelas quais se morre e o desprezo pela mulher.
10. Queremos destruir os museus, as bibliotecas, as
academias de toda a natureza, e combater o moralismo, o feminismo e toda a
vileza oportunista e utilitária.
11. Cantaremos as grandes multidões agitadas pelo trabalho,
pelo prazer ou pela sublevação; cantaremos as marés multicores e polifónicas
das revoluções nas capitais modernas; cantaremos o vibrante fervor nocturno dos
arsenais e dos estaleiros incendiados por violentas lutas eléctricas; as
estações esganadas, devoradoras de serpentes que fumam; as fábricas penduradas
nas nuvens pelos fios contorcidos de suas fumaças; as pontes, semelhantes a
ginastas gigantes que cavalgam os rios, faiscantes ao sol com um luzir de
facas; os piróscafos aventurosos que farejam o horizonte, as locomotivas de
largo peito, que pateiam sobre os trilhos, como enormes cavalos de aço enleados
de carros; e o voo rasante dos aviões, cuja hélice freme ao vento, como uma
bandeira, e parece aplaudir como uma multidão entusiasta.
Expressionismo
No final do século XIX pintores como Vincent Van Gogh e
Paul Cézanne já manifestavam tendências expressionistas. Todavia, esse termo
foi usado inicialmente em 1901 pelo pintor francês Julien-Auguste Hervé, para
designar seus quadros. Entretanto, o primeiro manifesto expressionista é de
1910, que apresenta-se como reação à estética impressionista de valorização
sensorial.
O expressionista tem a tendência de deformar a realidade de
maneira cruel, caricatural, devido às profundas influências recebidas pela
guerra. Assim sendo, faces amedrontadas e angustiadas são comuns em obras
expressionistas.
Em um dos manifestos expressionistas – publicado em 1917
pelo poeta Kasimir Edschmid – há a preocupação em estabelecer os rumos a serem
tomados pela literatura, mediante a visão expressionista:
“Assim o universo total do artista expressionista torna-se
visão. Ele não vê, mas percebe. Ele não descreve, acumula vivências. Ele não
reproduz, ele estrutura. Ele não colhe, ele procura. Agora não existe mais a
cadeia dos fatos: fábricas, casas, doença, prostitutas, gritaria e fome. Agora
existe a visão disso. Os fatos têm significado somente até o ponto em que a mão
do artista os atravessa para agarrar o que se encontra além deles”.
Dadaísmo
De acordo com especialistas, o Movimento Dadaísta (ou,
simplesmente, Dada) é, de certa forma, uma culminância dos outros três
movimentos de vanguarda. Há quem diga que ele nasceu em um café em Zurique,
Suíça, em 1916, onde se reuniam pessoas de várias escolas como o cubismo
francês, o expressionismo alemão e o futurismo italiano. Outros dizem, porém,
que o dadaísmo surgiu em várias cidades simultaneamente, mas ganhou ápice em
Zurique.
Tristan Tzara |
O objetivo é a destruição dos valores burgueses e a crítica
social por meio do non sense.
André Gide assim define essa vanguarda: “(...) é o dilúvio
após o que tudo começa”. Já a origem da palavra é um tanto controversa. Em
romeno, ‘dada’ significa ‘sim, sim’. Em francês, é traduzido por ‘cavalinho’.
Foi na Literatura que a ilogicidade e o espontaneísmo
dadaístas alcançaram expressão máxima. No último manifesto que divulgou, o
romeno Tristan Tzara (mentor do movimento) disse que o grande segredo da poesia
é que “o pensamento se faz na boca”. Foi dessa forma que ele orientou a
composição de poemas dadaístas:
Pegue num jornal.
Pegue numa tesoura.
Escolha no jornal um artigo com o comprimento que pretende dar ao seu poema.
Recorte o artigo.
Em seguida, recorte cuidadosamente as palavras que compõem o artigo e coloque-as num saco.
Agite suavemente.
Depois, retire os recortes uns a seguir aos outros.
Transcreva-os escrupulosamente pela ordem que eles saíram do saco.
O poema parecer-se-á consigo.
E você será um escritor infinitamente original, de uma encantadora sensibilidade, ainda que incompreendido pelas pessoas vulgares.
Pegue numa tesoura.
Escolha no jornal um artigo com o comprimento que pretende dar ao seu poema.
Recorte o artigo.
Em seguida, recorte cuidadosamente as palavras que compõem o artigo e coloque-as num saco.
Agite suavemente.
Depois, retire os recortes uns a seguir aos outros.
Transcreva-os escrupulosamente pela ordem que eles saíram do saco.
O poema parecer-se-á consigo.
E você será um escritor infinitamente original, de uma encantadora sensibilidade, ainda que incompreendido pelas pessoas vulgares.
Surrealismo
Com apoio nas teorias de Sigmund Freud e Karl Marx, o
Surrealismo surgiu na França em outubro de 1924, quando André Breton
(dissidente do Dadaísmo) lançou o Manifesto do Surrealismo.
O Surrealismo propõe que a arte flua livremente a partir do
inconsciente, da livre associação, incorporando elementos de ilogismo, do
idílio, da fantasia.
Quadro de Salvador Dali |
Explorando os limites do real, estudando a loucura, os
sonhos, os estados alucinatórios e quaisquer outros exemplos de manifestação do
inconsciente, os surrealistas conquistaram uma imagem de impacto, que chega até
nossos dias nas telas imortais de Salvador Dali, Juan Miró, Giorgio de Chirico
e René Magritte, para mencionar apenas os mais conhecidos.
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